2011-03-24

Nova edição do livro FAINA MAIOR

"Por que não fazermos uma viagem dos anos 30, de barra a barra, no «Santa Mafalda», «Cruz de Malta» ou no «Santa Joana»?  O mito do bacalhau... a dureza do bacalhau..."

Começa assim o livro FAINA MAIOR - A Pesca do Bacalhau nos Mares da Terra Nova, um clássico da literatura marítima portuguesa de finais do século XX, assinado pelo saudoso Capitão Francisco Marques e pela Dra. Ana Maria Lopes, que saiu em 1996 e esgotou há muito.
É um livro maravilhoso, bem escrito, bem ilustrado, bonito de ver e a fazer sonhar embalado pela aspereza do mar a bordo desses lugres da frota branca, que na década de 1930 ainda não fora promovida a "white fleet".
É um livro que nos dá em cada frase a candura das barbas brancas e sabedoria ilimitada do Capitão Marques, que parece estou a ver com a sua enorme simplicidade à popa do CREOULA, e os testemunhos entremeados de dedicação de investigadora de alma e coração que é Ana Maria Lopes.
Está lá tudo o necessário para 110 páginas de mar preto e branco com todas as cores da epopeia do bacalhau. Com simplicidade, sem toques moralistas de outros cronistas político-bacalhoeiros da nossa praça. E digo está lá tudo porque o livro acaba de ser re-editado e vai ser apresentado no Museu de Marinha de Lisboa no próximo dia 31 de Março. 
O convite é para todos, e comprem o livro, antes que se esgote...
Mais informações no Atlântico Azul.
Texto de /Text copyright L.M.Correia. For other posts and images, check our archive at the right column of the main page. Click on the photos to see them enlarged. Thanks for your visit and comments. Luís Miguel Correia

2011-03-21

Viagens CREOULA 2011

Após alguns meses de recato merecido atracado à Base Naval de Lisboa desde Outubro de 2010, o Navio de Treino de Mar CREOULA prepara-se para novas missões de divulgação e treino de mar, cuja programação aguarda aprovação superior.
Sabe-se que este ano o CREOULA deverá navegar pelo Atlântico e Mediterrâneo numa série de viagens com cientistas, estudantes universitários e outros, e grupos de civis à descoberta deste belo navio e do mar português...
Imagens do CREOULA no Alfeite no passado dia 18 de Março de 2011.

Ainda e sempre o CREOULA


Ainda e sempre o NTM CREOULA em pormenores traduzidos em fotografias de Luís Miguel Correia...
Ancora da sanefa da escada de portaló do CREOULA e rede de protecção da mesma escada, ou prancha, como também se diz no mar e a bordo dos navios...
As expressões relativas ao mar e aos navios na língua portuguesa são de uma riqueza muito grande e interessantíssimas, reafirmando que em termos verbais ainda seremos de facto um país de Marinheiros.

2011-03-19

QUATRO CISNES


A Base Naval de Lisboa apresentava ontem estas imagens surpreendentes de quatro cisnes brancos:

Um de aço com quatro mastros amarelos, armação em lugre e uma história magnífica de verdadeiro ícone do mar português, com mais de 70 anos nos oceanos;

Os outros três fazem parte de um grupo de cisnes que adoptaram recentemente as águas da Base do Alfeite e nesta imagem saudavam o CREOULA, cujo costado se vê com a sua chapa rebitada que se quer eterna...

Fotografias de Luís Miguel Correia - 2011

Mastros amarelos...



Na Base Naval de Lisboa, no Alfeite, o lugre de quatro mastros CREOULA prepara-se para para mais uma época de embarques e viagens pelo Atlântico e Mediterrâneo.

Impecavelmente pintados, os mastros brilham no amarelo tradicional do navio...

Imagens datadas de 18-03-2009.

2011-03-15

CREOULA em dia de boa pesca

Convés do CREOULA num dia de boa pesca durante a campanha de 1948, em águas do Gronelândia.
Fotografia tirada a 28 de Julho de 1948 pelo então Piloto do navio José Fraga e publicada no livro de João Gomes Vieira O HOMEM E O MAR - Os Açoreanos e a Pesca Longínqua nos bancos da Terra Nova e Gronelândia, publicado em 2004.

Os 62 dias do CREOULA...

A ideia de que o CREOULA foi construído em 62 dias tem que se lhe diga e penso que a realidade será um pouco diferente. 
O navio foi encomendado em 11 de Setembro de 1936 ainda à Sociedade de Construções Navais, empresa que deixou de ser concessionária do estaleiro naval da AGPL à Rocha do Conde de Óbidos, a 1 de Janeiro de 1937, quando aquela infraestrutura industrial foi entregue a CUF. As encomendas dos navios COMANDANTE PEDRO RODRIGUES (Para os Pilotos de Lisboa), CREOULA,  e SANTA MARIA MANUELA foram assim herdadas pela CUF. 
A história "oficial" dos 62 dias úteis de construção do  CREOULA tem de ser vista na perspectiva da época enaltecendo as qualidades dos nossos operários, etc..., como forma de aumentar a auto-estima nacional e reconhecer as virtudes do Governo da época e em especial do Chefe. O próprio estaleiro, sob orientação da CUF passou a estar integrado numa organização poderosa com uma boa máquina de propaganda que apresentava todas as realizações do estaleiro com superlativos e alguma exaltação realçando-se a nacionalização do estaleiro e da industria naval,como contraponto aos interesses franceses que dominavam a anterior concessionária. 

Assim as datas associadas à construção do CREOULA são:

11 de Setembro de 1936: contrato de encomenda

3 de Fevereiro de 1937: assentamento da quilha

10 de Maio de 1937: lançamento à água

30 de Junho de 1937: saída de Lisboa para a primeira campanha de pesca.

Os dias que o navio demorou a ser construído devem ser referidos desde a data de encomenda até à data de entrega, que foi Junho de 1937... 
De qualquer das formas, criar o CREOULA e o seu irmão em poucos meses foi um feito a assinalar... Hoje perdemos a capacidade demonstrada em 1937. Uma lancha hidrográfica como a AURIGA, construída no Alfeite, demorou quase 4 anos desde o assentamento da quilha a 17 de Setembro de 1984 até ao lançamento (26-05-1987) e a entrega a 2 de Março de 1988...

2011-03-09

Os outros CREOULAS




SANTA MARIA MANUELA vai ao Canadá

O SANTA MARIA MANUELA vai comemorar os 74 anos do lançamento à água em águas canadianas, devendo entrar em Toronto exactamente no dia 10 de Maio de 2011, data em que foi lançado à água com o seu gémeo CREOULA em Lisboa, no ano já distante de 1937.
O actual armador do navio está a organizar uma grande viagem transatlântica aos Açores e Canadá, com partida de Aveiro já no dia 18 de Abril e passagem por Ponta Delgada a 25 e 26 de Abril.
Foto e texto de Luís Miguel Correia - 2011

2011-03-04

Memórias de uma Instruenda


«Contacto-vos a partir da esplanada do John David's de Cascais (virou um verdadeiro Peter's). É Domingo, dia 14 de Agosto de 2005, estão 40º, estou a beber uma Coca-Cola e a ouvir reggae muçulmano (?!), e escrevo-vos para vos contar o meu dia de hoje.

Desembarcámos na Terça-feira, não foi? Pois bem, só anteontem deixei de ouvir o gerador e de sentir a terra a abanar. Do aeroporto fui a correr a uma tasca com o Henrique (que vos manda saudades). No dia seguinte fartei-me de "trabalhar": fiz a Lista provisória, enviarei brevemente a definitiva. Na Quinta-feira pintei um quadro (ou seja, estraguei uma tela), uma praia e uns peixes, no meio do céu e do mar Azul (a minha máquina fotográfica acaba de ficar sem bateria, enviarei noutro dia), mas já me aconselharam a fazer um curso de pintura. Na Sexta-feira bati umas bolas e fui para a piscina. No Sábado tive uma almoçarada. Todas as noites tenho ido jantar às Festas do Mar de Cascais (sardinhadas, shots de ginginha em «chocolate cup», churritos e concertos a toda a hora), porque fundeados apenas não chega e já bastou estar na Horta a ver navios.

E hoje... embarquei numa canoa do Tejo genuína (chamada «Canastrinha», de 1887), oriunda da Moita, e participei numa regata simpática de canoas do Tejo genuínas que largou da Marina (algo penosa, pelo calor e pela falta de vento). Acabámos por ter de ser rebocados no final (pela «Lili Caneças» da Moita e pela «Boneca» de Cascais), porque o motor de 8 cavalos falhou!!! (onde é que já vi este filme?...) Mas vimos golfinhos, centenas de peixes, gaivotas, alforrecas e... MERGULHADORES! Imensos!!! Em frente à Boca do Inferno e no Cabo Raso! AMIGOS, venham mergulhar em Cascais! Ofereço-vos um serviço de proeira completo, com direito a cafézinho e a travesseiros e tudo!

As Festas terminam amanhã... com um fantástico concerto da Vanda Stuart e do Sérgio da Operação Triunfo e, à meia noite, haverá FOGO DE ARTIFÍCIO!!!

Agora está a haver uma largada de toiros na Praia dos Pescadores. Na Terça-feira, iniciarei as minhas deslocações diárias a Lisboa... a ver o Mar... O registo está bem assim?

Guardamos tantas recordações desta «Expedição», como as deveremos registar no Diário, Chefa? Por dia? Por quarto? Por mastro? Por pessoa? Por zona do navio?

Por dia: Segunda-feira, dia 8 de Agosto de 2005: estamos fundeados em frente à Horta, vê-se ao longe as barraquinhas das Festas do Mar, iluminadas pelo Sol, cheira a maresia, cheira a Verão, está-se tão bem no Mastro da Bujarrona (ninguém ainda reparou que estou na rede), mas obrigam-nos a ir a terra. Que maçada. Temos duas horas, duas horas apenas para mostrarmos o que valemos. Saltamos para as semi-rígidas, entediados. Por favor, despachem lá isso mas é, que temos uma festa Mémé a bordo às 18h00. Desembarcamos no pontão da Marina, subimos a correr as escadinhas que dão para a marginal, atravessamos e entramos no Peter's... que sensação. Sete gins depois, é hora de regressar, para nos arranjarmos para a festa. Foi um pouco estranho o regresso, porque as escadinhas de portaló não paravam quietas, aliás tinham-nos posto DUAS escadas... Às 04h43 da manhã do dia seguinte alguém continuava com sede.

Por quarto: aquele que fiz SOZINHA, das 04h00 às 08h00. Que maravilha, que tranquilidade, que sossego. Os meus chefiados eram altamente especializados e tinham palestras para preparar e fotoplâncton e dinoflagelados para recolher (o Reggae muçulmano acaba de passar a Reggae brasileiro: «Rasta no pé, corpo na canção, toca a Radiola, essa Maguinha é um furacão!» «Rita Ambrozina e Maria das Dores, de São Paulo, de Nova York e ainda dos AÇORES!!!»)

Por mastro: o Grande, como só podia ser! Nada como carregar o pano do alto da casota do Grande!

Por pessoa: preciso de trinta dias, dois deles só para o nosso Director de Treino.

Por zona do navio: o meu esconderijo, nas traseiras da casota da Mezena. A olhar a Bandeira de Portugal, a água num turbilhão, os pés no moitão, sentada na arca de madeira, a alma à deriva.

Um abraço a todos, um beijinho à Chefa,

Raquel I-13

Chefe do Grupo 3»

2011-03-03

Embuste filmico

Em Janeiro o Blogue do CREOULA divulgou a exibição deste filme documentário que foi transmitido pela RTP 2 na noite de Domingo 23 de Janeiro - noite de eleições presidenciais.
Vi e não goste. 
Não é um filme sobre o CREOULA, nem sobre a pesca do bacalhau, sério e isento, mas uma diatribe cinéfila cujos actores amadores não representam nada do que foi a grande aventura da frota branca nos mares gelados do Atlântico durante o século XX.
O guião está cheio de imprecisões e desonestidades algumas das quais atingem a raia do disparate.
Uma oportunidade perdida que aportou num caudal de homenagem à ignorância e à desmaritimização.
Porque o fenómeno da desmaritimização é além de económico e político, também cultural, e este documentário é a negação da cultura marítima.
Um mau filme vestido de pretensiosismo político-cultural. Só espero que semelhante embuste não tenha sido financiado com os meus impostos, isto é com o meu suor e sangue...
Texto de Luís Miguel Correia - 2011

Um jovem septuagenário...

A estética quando é plenamente conseguida, como acontece com o aspecto exterior do nosso CREOULA, proporciona uma dimensão intemporal aos objectos ou seres qualificados por esse conceito ao mesmo tempo abstracto e presente, palpável em termos de sentidos e presença material.
O CREOULA é de facto intemporal, como parece contar a sua história de mais de sete décadas sempre a engrandecer o nome de Portugal nos mares.
Dos muitos segredos que guarda a alma deste navio, um dos mais óbvios é a forma como o CREOULA interpreta e vive o segredo da juventude. Um jovem que dentro de dois meses fará 74 anos. Merece uma festa  é tempo de se começar a pensar no assunto...
Texto e fotografia de Luís Miguel Correia - 2011

2011-03-01

CREOULA de regresso à Azinheira...

As referências  ao lugre bacalhoeiro CREOULA na imprensa portuguesa do tempo em que ia à pesca do fiel amigo,  isto é de 1937 a 1973, são muitas vezes reduzidas a uma linha aqui e ali, como acontece com a rubrica dedicada  aos navios entrados em Lisboa e referidos na secção de movimento marítimo em Lisboa nas páginas do velho Jornal do Comércio. Normalmente era assim, apenas uma linha:
BARRA DE LISBOA - Navios entrados e 16 de Setembro de 1956: (...) CREOULA, português, procedente da Gronelândia, com carregamento de bacalhau (...)
A largada tinha sido em Abril logo a seguir à cerimónia da bênção dos navios do bacalhau frente aos Jerónimos, começava-se a pescar nos bancos da Terra Nova, muitas vezes fazia-se escala em St. John's, para abastecer de isco e mantimentos e depois seguia-se para a Gronelândia para acabar de encher o porão e iniciar o regresso a Portugal, habitualmente durante o mês de Setembro. Antes da entrada em Lisboa fazia-se uma escala em Ponta Delgada para desembarcar os pescadores naturais de São Miguel, pois a Parceria Geral de Pescarias fazia questão de dar emprego aos pescadores açoreanos.
Chegado a Lisboa, o CREOULA seguia para a Azinheira, amarrando às bóias em frente à seca da empresa armadora. Procedia-se à descarga do peixe, efectuavam-se beneficiações ao navio e ia-se logo começando a  preparar a campanha do ano seguinte, numa rotina que parecia desafiar os ventos de mudança que se viviam no sector das pescas. Foi assim até 1973, no final de Dezembro desse ano o CREOULA alterou o registo na capitania do porto de Lisboa, de navio da pesca longínqua para o tráfego local "para posterior venda ou abate." A sorte não abandonou o carismático lugre pescador e passados alguns anos de incerteza deu-se a compra ao Estado Português e a sua reconversão para navio de treino de mar, actividade que continua a desenvolver sob os auspícios da Marinha...
Imagem da colecção de L. M. Correia com texto de Luís Miguel Correia - 2011